SAIBA QUAIS AS MUDANÇAS TRAZIDAS PELA LEI 14.010/2020 A FIM DE REGULARIZAR AS RELAÇÕES JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO FACE A PANDEMIA

Nessa última sexta-feira (12/06/2020), sancionada pelo presidente da República, fora publicada a Lei nº 14.010/2020, que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório (RJET) para regulação de relações jurídicas de Direito Privado em virtude da pandemia do coronavírus (Covid-19).

Importante ressaltar que a referida Lei reflete diretamente em institutos de grande importância da Parte Geral do Código Civil: no âmbito da prescrição e da decadência e na disciplina das pessoas jurídicas de Direito Privado.

Nos moldes do art. 3º da Lei nº 14.010/2020, os prazos prescricionais consideram-se impedidos ou suspensos a partir da entrada em vigor da Lei até 30 de outubro de 2020. Tal artigo também aplica-se a decadência.

O referido artigo pode ser interpretado como uma regra subsidiária, pois, conforme descrito em seu § 1º, havendo previsão legal específica de impedimento, suspensão ou até mesmo interrupção do prazo prescricional, esta prevalecerá em razão da regra constante no caput do artigo sob comento.

Levando em consideração a atual situação socioeconômica desencadeada pela pandemia, o legislador impediu o transcurso do prazo prescricional, visando, com isso, resguardar os interesses dos credores em geral.

Destaca-se que à suspensão do prazo decadencial narrada no art. 3º, § 2º, da Lei do RJET também deve se aplicar à paralisação da fluência dos prazos de usucapião prevista no art. 10 dessa mesma Lei no qual determina a suspensão dos prazos de aquisição para a propriedade imobiliária ou mobiliária, nas diversas espécies de usucapião, a partir da vigência da Lei até 30 de outubro de 2020.

Isso significa, por exemplo, que, se o sujeito exercia posse mansa e contínua, com justo título e boa-fé, há 8 anos, tendo em vista a superveniência da pandemia, o prazo de prescrição aquisitiva ficará suspenso, da vigência da nova Lei até 30 de outubro de 2020. Com o advento do termo final, o prazo voltará a correr, devendo ser computado o lapso já transcorrido.

Por fim, importante esclarecer que a paralisação ampla e irrestrita dos prazos prescricionais, prevista no art. 3º da Lei do RJET, só se aplica entre a entrada em vigor dessa Lei e final de outubro de 2020, porém, prazo este que cabe discussão já que, como marco inicial para contagem do prazo, no caso da pandemia, é razoável considerar que, a partir de 3 de fevereiro de 2020 (data da Portaria GM/MS nº 188/2020), já se pode presumir que a pandemia já impunha dificuldades para os titulares de direitos violados adotarem atos de cobrança, a bloquear a fluência do prazo prescricional, salvo prova em contrária no caso concreto.

Outro ponto de suma importância trazido pela Lei do RJET refere-se as realizações de assembleias. Nos termos do art. 5º da Lei, toda assembleia geral, poderá ser realizada pelos meios eletrônicos, caso em que a manifestação dos participantes poderá ocorrer por qualquer meio virtual indicado pelo administrador e produzirá todos os efeitos legais de uma assinatura presencial.

Entende-se por meio virtual, aquele que permiti a comunicação instantânea (on-line), como plataformas de chat (como um grupo no WhatsApp) ou de videoconferências (como o aplicativo Zoom).

Nesse período de coronavírus, o síndico deverá convocar assembleia virtual para deliberar sobre a nomeação de novo síndico se o prazo do seu mandato estiver para expirar. Caso tal não seja viável, o art. 12, parágrafo único, da Lei do RJET admite a prorrogação automática do mandato para 30 de outubro de 2020.

No que se refere ao Direito do Consumidor, com o objetivo de dar segurança jurídica aos fornecedores que estão comercializando seus produtos de forma virtual, o art. 8º do RJET positivou uma interpretação extensiva do art. 49 do CDC que permite a devolução do produto pelo prazo de 7 (sete) dias em compra fora do estabelecimento comercial, especificamente para dois tipos de produtos essenciais: os bens perecíveis ou de consumo imediato, como os casos de pedidos de pratos de comida por “delivery”; e os de medicamentos.

Em síntese, até 30 de outubro de 2020, fica suspenso o direito potestativo conferido ao consumidor, previsto no art. 49 do CDC, no sentido de rejeitar imotivadamente a compra na hipótese de entrega domiciliar de produtos perecíveis ou de consumo imediato e medicamentos.

No âmbito procedimental do Direito de Família e das Sucessões, a Lei do RJET modifica aspectos legais em duas situações: na prisão civil e no que se refere ao prazo de inventário e de partilha.

Nos termos do art. 15 da Lei, até 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia, prevista no art. 528, § 3º e seguintes Código de Processo Civil, deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.

No que tange o prazo para instauração do inventario e partilha este também será suspenso. Caso a morte haja ocorrido a partir de 1º de fevereiro de 2020, o termo inicial do prazo de dois meses previsto no referido art. 611 será postergado para 30 de outubro de 2020.

Verifica-se que a toda evidência, o judiciário está sujeito às restrições da quarentena e isolamento social eventualmente impostas pelo Poder Público, em decorrência da pandemia. Assim, coerente a adequação de normas e direitos no âmbito civil, frente ao cenário vivenciado, passíveis de discussões e questionamentos.

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